28/10/05

Miguel Sousa Tavares na TVI

"Justiça: uma greve corporativa e egoísta

TVI - Continuamos com o braço de ferro entre o Governo e o sector da
Justiça. Como te parece o evoluir da situação? Quem tem razão nesta altura?

MST - A questão de fundo é saber se eles têm ou não razões para fazer greve.
Estou inteiramente de acordo com o que disse José Sócrates. Não percebo como é que uma alteração ao sistema de saúde, uma alteração às férias judiciais, a suspensão das carreiras - que é igual, provisoriamente, para todos os funcionários públicos -, o que é que tudo isso tem a ver com a independência. O que é que isso justifica que o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério. Público, vá fazer queixa à ONU, ao comissário da ONU para a independência judicial? Nada. Cronologicamente, começou-se a adivinhar a greve assim que o Governo reduziu as férias de Verão dos
tribunais de dois para um mês. Foi a partir daí que se começou a organizar a greve. Aquilo que os magistrados deveriam ter feito e não fizeram - se não estavam de acordo com essa medida - era dizer: "esta medida não serve, concordamos que é preciso apressar a justiça, concordamos que os processos estão lentos, que a tramitação dos processos é insuportável para quem espera por uma sentença do tribunal, estas medidas não servem, estão aqui outras, vamos estudá-las". Irem para a greve só por acharem que está em causa a independência deles e o estatuto de dignidade deles não faz sentido. Mais uma vez digo: os magistrados, os juízes, os funcionários judiciais, o Ministério Público nunca pensam nos utentes da justiça. Nunca. Em todo este processo de greve já assisti a vários debates, tenho lido todos os artigos que se têm escrito e tenho-os ouvido falar profusamente sobre isto. Nunca
houve uma preocupação de dizerem como é que a Justiça pode funcionar melhor. Aparentemente eles acham que a Justiça está óptima, mas não está. E a prova que não está é que, tirando as pessoas que tinham os julgamentos marcados para esta semana e os seus advogados, ninguém vai dar por esta greve. As pessoas esperam anos em tribunal. Uma semana não vai fazer nenhuma diferença. Por isso acho que esta greve é uma greve por razões sindicais corporativas mas, sobretudo, é uma greve egoísta porque, quanto mais ouço as explicações dos magistrados, menos razões vejo para ela.

TVI - Mas há um grande descontentamento...

MST - Ninguém gosta de perder privilégios. Isso é mais que óbvio. Mas, particularmente porque se trata de um órgão de soberania e porque são pessoas que têm, por profissão, de serem justos, elas devem olhar não para a sua situação particular mas para a situação dentro do conjunto dos funcionários públicos, dentro do clima económico e das dificuldades financeiras que o país tem e, sobretudo, dentro da ineficácia da máquina da Justiça. E têm de encontrar soluções. Não é porem-se numa ilha, numa torre de marfim, e dizerem: "nós temos este estatuto e não abrimos mão, senão está em causa a nossa independência". Eu ouvi explicações do arco-da-velha. Até houve um magistrado que disse que o Governo quer é substituir o procurador-geral da República por um político e o Conselho Consultivo da Procuradoria, por capatazes políticos, etc. Nada disso está em causa."

Agora é só trocar justiça por outras áreas e o desenvolvimento pode ser quase igual.

1 comentário:

Anónimo disse...

bom comeco