08/06/04

A Crise da PJ do Porto

Todos os defensores da centralização de poder nas macroestruturas da Polícia ou do Ministério Público não descansariam um segundo enquanto não "segurassem" o caso "Apito Dourado". Nem que fosse pelas vias da imposição de um poder que agora fica sob inevitável suspeita pública.

O ataque do novo director da Polícia Judiciária do Porto aos dois sub-directores, Teófilo Santiago e João Massano, que foram afastados na sequência da demissão do magistrado Artur Oliveira, é vergonhoso. Portador das amarguras da direcção-nacional da PJ, ou seja, de Adelino Salvado, o senhor magistrado Ataíde das Neves fez uma espécie de julgamento sumário dos dois sub-directores dizendo que "houve problemas de liderança", que não confia em nenhum deles, entre outros mimos. Metralhou a torto e a direito, dando para dentro da polícia um péssimo exemplo para todos os que se preocupam em trabalhar, apresentar resultados e defender uma ideia de serviço público cada vez mais em desuso.

A primeira razão da vergonha está no facto do senhor magistrado que agora dirige a PJ do Porto atacar dois operacionais da polícia que deram à instituição e ao país mais do que o referido senhor alguma vez dará. Basta confrontar o currículo profissional de uns e outros. Se alguma coisa avançou no combate à criminalidade organizada e ao crime económico em Portugal deve-se a pessoas como Teófilo Santiago e João Massano, que estão na PJ ou por ela passaram em funções de direcção e que perceberam, há uns 15 anos, que esse era o incontornável caminho. Sobre isso falam os grandes e os pequenos casos que foram sendo investigados com sucesso.

Depois, o referido senhor magistrado ataca os dois inspectores responsáveis pela operação "Apito Dourado" e pelos incomparáveis níveis de operacionalidade deste departamento da PJ porque sabe que nem um nem outro lhe responderão. Por dever de ofício mas, sobretudo, por educação e elevado sentido de interpretação de uma noção de Estado, porventura excessivamente austera, que nada tem a ver com a sua instrumentalização em função de conveniências pessoais ou partidárias.

Se algum mérito tiveram as palavras do dito senhor magistrado foi o de deixar claríssima a oportunidade de um inquérito parlamentar ou qualquer outro acto de fiscalização externa sobre o que se está a passar na PJ do Porto, em particular, e na PJ em geral. É uma questão de controlo democrático elementar que não pode ser tratada da forma atabalhoada e patética como Durão Barroso fez a semana passada.

A substituição destes dois sub-directores foi, percebe-se agora, um acto de poder ressabiado, uma confissão de impotência momentânea quanto à questão essencial que é, obviamente, a luta pelo controlo do inquérito "Apito Dourado" e, em particular, pelo verdadeiro "filet-mignon" que são as 15 mil horas de escutas telefónicas validadas.

Como aqui se tinha previsto pouco depois da operação, todos os defensores da centralização de poder nas macroestruturas da Polícia ou do Ministério Público não descansariam um segundo enquanto não "segurassem" o dito inquérito. Nem que fosse pelas vias da pura e simples imposição de um poder que agora fica sob inevitável suspeita pública. O poder dos senhores que pensam que são os donos da PJ e o dos que os nomearam.

Tudo episódios e factos que dariam um verdadeiro tratado sobre os fracos níveis de transparência da justiça e da democracia em Portugal.

Eduardo Dâmaso

1 comentário:

Anónimo disse...

Só não vê quem não quiser. Bruno Dias